quinta-feira, 13 de dezembro de 2012


 Projeto prevê pena de detenção para revista íntima

O projeto de lei nº 583/2007 de autoria da deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) proíbe a revista íntima de mulheres nos locais de trabalho, incluídas as empresas privadas, os órgãos públicos da administração direta e indireta, as sociedades de economia mista, as autarquias e as fundações em atividades no Brasil.

No artigo 2º é estipulada multa de 50 salários mínimos para o infrator, a suspensão, por 30 dias, do funcionário da empresa que procedeu à revista, em caso de reincidência e, ainda, incorrendo em nova reincidência, o empregador ficará sujeito à detenção de seis meses a um ano.

De acordo com a deputada, apesar do avanço alcançado pelas mulheres brasileiras no reconhecimento dos seus direitos, permitindo que grande parte das reivindicações esteja representada na atual Constituição Federal, a igualdade garantida na Lei ainda é desrespeitada muitas vezes no cotidiano delas, como o grande número de trabalhadoras que são constrangidas a se submeterem diariamente à prática da revista íntima, em total desrespeito ao artigo 5º, inciso X que estabelece serem invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.

O objetivo do projeto, segundo Alice Portugal "é garantir e assegurar à mulher o direito ao trabalho sem ter, sucessivamente, sua intimidade violada". Entre os vários parlamentares que apoiaram sua iniciativa, está a deputada Teresa Surita (PMDB-RR), para quem "os efeitos dessa prática nas mulheres são devastadores".

A doutrina e a jurisprudência brasileira consideram a revista pessoal - tanto a realizada diretamente no corpo do empregado como a feita em objetos como bolsas e sacolas - uma forma de concretização do poder de controle do empregador. Mas para a procuradora Sandra Lia, o "entendimento até hoje dominante a respeito da revista não surgiu de um correto juízo de ponderação, posto que se protegeu apenas o direito de propriedade em detrimento do direito à intimidade e à vida privada".

A revista em objetos

Além da revista íntima, os trabalhadores estão sujeitos à revista de objetos como bolsas, sacolas, papéis, carros, armários, escrivaninhas e mesas, geralmente toleradas pela jurisprudência, não ensejando, na maioria dos casos, indenização por dano moral.

Todavia, muitos trabalhadores se sentem constrangidos com essa forma de revista, por entenderem violadas sua intimidade e privacidade, especialmente quando ela é rotineira e por essa razão, ingressam com ação na Justiça do Trabalho buscando indenização por danos morais.

Para o ministro corregedor-geral da Justiça do Trabalho, Barros Levenhagen, a revista realizada com moderação e razoabilidade não caracteriza abuso de direito ou ato ilícito, constituindo, na realidade exercício regular do direito do empregador ao seu poder diretivo de fiscalização.

"Mas no momento em que o vistoriador avança e passa a fazer contato corporal com o empregado, a pretexto de estar vistoriando a bolsa, ele já passa a incorrer no ato faltoso da revista íntima", ressalta. Por isso, explica o ministro, se penaliza o empregador, por causa da quebra do princípio da inviolabilidade da privacidade do empregado.

Revista em hipermercado

São inúmeros os julgados do TST nesse sentido. Um exemplo é a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho da 5ª Região por dano moral coletivo contra a Companhia Brasileira de Distribuição, Grupo Pão de Açúcar, pelo fato desta ter realizado revista visual em bolsas e sacolas dos empregados.

Embora a sentença de Primeiro Grau tenha sido favorável ao MPT com a condenação da empresa ao pagamento de R$ 100 mil por dano moral coletivo e multa de R$ 5 mil por trabalhador prejudicado, a empresa conseguiu revertê-la no TST. Ao julgar ação rescisória do Pão de Açúcar, a Subseção 2 Especializada em Dissídios Individuais (SDI2) do Tribunal acompanhou o voto do ministro Ives Gandra Martins, relator do processo, que deu provimento ao recurso da empresa (em juízo rescisório) e julgou improcedentes os pedidos formulados pelo MPT.

Para o relator condenar a empresa por dano moral, por eventual lesão causada ao empregado "somente faz sentido quando se verifica a repercussão do ato praticado pelo empregador na imagem, honra, intimidade e vida privada do indivíduo". Mas o ministro considerou inexistente o abuso de direito e a ocorrência de excessos ou atos discriminatórios pela empresa, elementos, que a seu ver, ensejariam o dano moral em virtude do sofrimento e da humilhação do empregado.

A revista em bolsas e sacolas dos funcionários, sem ocorrência de contato físico, mas apenas visual de quem a realizou e de forma generalizada, não gera direito à indenização por dano moral, concluiu o ministro Ives Gandra em seu voto.

Empresa de varejo

Em outra ação que chegou ao TST, uma empregada, que exerceu a função de crediarista na rede de varejo Irmãos Muffato & Cia Ltda, postulou indenização por danos morais no valor de 100 salários mínimos, por ter diariamente sua bolsa revistada. Segundo afirmou na inicial da reclamação trabalhista, as revistas de bolsas, carteiras e sacolas aconteciam todos os dias na saída da portaria e eram realizadas pela segurança da empresa.

Para a crediarista, eram discriminatórias, uma vez que os gerentes não eram submetidos a elas, sem contar o fato de serem desnecessárias, pois a empresa tinha meios mais seguros e apropriados de proteger seu patrimônio como as câmeras e alarmes sinalizadores ali instalados.

Mas seu pedido foi rejeitado. Verificou-se para o juiz da Quarta Vara do Trabalho de Londrina (PR) que a revista era feita sem contato físico, além de não ter sido provado excesso de qualquer espécie ou mesmo que a funcionária tenha sofrido qualquer dano de ordem moral durante as revistas. O magistrado destacou ainda, que a mera realização de revista, como o objetivo de prevenir furtos "compreende-se no exercício legítimo e regular dos direitos potestativos do empregador, a fim de garantir a proteção ao patrimônio, não violando qualquer direito do autor".

A autora recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho do Paraná (9ª Região), o qual reformou a sentença e condenou a Muffato a pagar-lhe indenização por danos morais no valor de R$ 25 mil.

A empresa buscou a reforma de decisão junto ao TST alegando a inexistência de revista íntima, mas apenas em bolsas e de forma visual. A Quinta Turma, por unanimidade, acompanhou o relator, ministro Brito Pereira, que deu provimento ao recurso da empresa, para excluir a condenação arbitrada pelo Regional.

É certo que o artigo 5º, inciso X, da Constituição da República, assegura o direito à indenização por dano material ou moral decorrente da violação do direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, lembrou o ministro Brito Pereira. Contudo, para ele, diante dos fatos registrados pelo Regional, como o de a revista ser efetuada em bolsas, sacolas ou mochilas da autora, sem contato físico ou revista íntima, "não teve caráter ilícito e não resultou, por si só, em violação à intimidade e à honra da recorrida, a ponto de configurar dano moral gerador do dever de indenizar".

Valor material X imaterial

De acordo com o corregedor-geral da Justiça do Trabalho, ministro Barros Levenhagen, o TST não é contrário ao poder de o empregador realizar a revista, "mas se preocupa em que ela ocorra de forma moderada e observando os princípios constitucionais de inviolabilidade da privacidade da pessoa humana consagrados na Constituição".

Para o ministro, o empregador não pode se exceder nos atos de coordenação e fiscalização do trabalho, submetendo o empregado a uma revista vexatória, caso contrário incorre em dano moral.

Juiz não pode alterar enquadramento penal ao receber a denúncia

O juiz não pode modificar a definição jurídica dos fatos narrados na denúncia, no momento em que a recebe. Com base nesse entendimento, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu recurso em habeas corpus para anular decisão que modificou a capitulação jurídica dada aos fatos pelo Ministério Público e reconheceu a extinção da punibilidade em relação a um empresário de Goiás, pela prescrição da pretensão punitiva estatal.

O empresário foi denunciado pela suposta prática de crime contra a ordem tributária. Ele teria deixado de realizar lucro inflacionário diferido relativo ao Imposto de Renda pessoa jurídica, no ano-calendário de 1998, totalizando o débito de R$ 3.850.060,09. Em seguida, encerrou as atividades da empresa sem comunicar o fato à Secretaria da Receita Federal.

Na denúncia apresentada à Justiça, o Ministério Público afirmou que o empresário teria cometido o crime descrito no artigo 2º, inciso I, da Lei 8.137/90: dar declaração falsa ou omitir informações com o objetivo de evitar o pagamento de tributos. A pena prevista é de seis meses a dois anos e o prazo de prescrição, que varia em função da pena máxima, fica em quatro anos. Nessa hipótese, o crime já estaria prescrito no ato da denúncia.

No entanto, ao receber a denúncia, o juízo de primeiro grau não vislumbrou a ocorrência da prescrição, pois considerou que a conduta narrada se amoldava ao delito do artigo 1º, inciso I, da mesma Lei 8.137 – que consiste em, efetivamente, suprimir ou reduzir tributo, mediante declarações falsas ou omissão de informações às autoridades fiscais. A pena vai de dois a cinco anos.

“Portanto, no caso dos autos, a prescrição da pretensão punitiva se dá em 12 anos, nos termos do artigo 109, inciso III, do Código Penal. Considerando que o fato ocorreu em 1998, ainda não está prescrito”, assinalou o juiz.

Novo enquadramento

Inconformada, a defesa impetrou habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), sustentando que o empresário seria vítima de constrangimento ilegal. Argumentou que a acusação dizia respeito a ilícito já prescrito, não podendo o julgador, no ato de recebimento da denúncia, adotar conclusão diversa da exposta pelo Ministério Público em relação ao enquadramento jurídico dos fatos narrados na peça inicial.

O TRF1 negou o pedido, entendendo que o magistrado, quando aprecia a defesa preliminar, está autorizado a conferir classificação jurídica diversa da contida na denúncia, porque essa avaliação sobre a capitulação dos fatos apontados é imprescindível ao exame da alegação de prescrição, que se baseia na pena em abstrato prevista para cada crime.

No STJ, a defesa reiterou seus argumentos, insistindo em que a fase de recebimento da denúncia não é adequada para a alteração da classificação jurídica dos fatos, principalmente quando tal modificação é feita para piorar a situação do réu.

Condições da ação

Em seu voto, o ministro Jorge Mussi, relator do caso, ressaltou que a ação penal pública é iniciada por denúncia formulada pelo órgão ministerial, e é a partir do exame dessa peça processual que o magistrado analisará a presença das condições da ação, a fim de que acolha, ou não, a inicial acusatória.

“Assim, a verificação da existência de justa causa para a ação penal, vale dizer, da possibilidade jurídica do pedido, do interesse de agir e da legitimidade para agir, é feita a partir do que contido na peça inaugural, que não pode ser corrigida ou modificada pelo magistrado quando do seu recebimento”, afirmou Mussi.

“Ainda que o acusado se defenda dos fatos narrados na denúncia, e não da definição jurídica a eles dada pelo Ministério Público, não se pode admitir que, no ato em que é analisada a própria viabilidade da persecução criminal, o magistrado se manifeste sobre a adequação típica da conduta imputada ao réu, o que, evidentemente, configura indevida antecipação de juízo de valor acerca do mérito da ação penal” acrescentou o ministro.

Inércia da Justiça

Jorge Mussi considerou “prematura e precipitada” a atidude do juízo, pois, antes mesmo da instrução do processo, concluiu que o empresário não teria apenas falseado ou omitido informações para se eximir do pagamento de tributos, mas teria efetivamente reduzido tributos por meio dessas condutas.

Esse comportamento do juízo, segundo Mussi, ao modificar os parâmetros estabelecidos pelo titular da ação penal a fim de não reconhecer a prescrição, viola o princípio da inércia do Judiciário – que só atua quando provocado, “não podendo instaurar ações penais de ofício”.

O relator observou que há, na doutrina e na jurisprudência, o entendimento de que em algumas situações o juiz pode corrigir o enquadramento contido na denúncia logo que a recebe, mas apenas quando é para beneficiar o réu ou permitir a correta fixação da competência ou do procedimento a ser adotado na ação.

Segundo o ministro, mesmo havendo erro na tipificação dos fatos descritos pelo Ministério Público, ou dúvida quanto ao exato enquadramento jurídico dado a eles, cumpre ao juiz receber a denúncia tal como proposta, para que, no momento em que for dar a sentença, proceda às correções necessárias.

Considerando a sanção máxima do delito atribuído pelo Ministério Público ao empresário e tendo em conta que os fatos teriam ocorrido em 1999, o ministro concluiu que a prescrição da pretensão punitiva estatal já se teria consumado quando a denúncia foi recebida, em 2008, mais de quatro anos depois.

O recurso em habeas corpus foi provido por decisão unânime da Quinta Turma.

RHC 27628

Disponível em: http://www.aasp.org.br/aasp/imprensa/clipping/cli_noticia.asp?idnot=13301

Juiz não pode continuar ação penal sem analisar defesa prévia

Mesmo tratando da defesa prévia de forma sucinta e sem exaurir todos os seus pontos, o magistrado deve analisá-la, sob pena de nulidade de todos os atos posteriores à sua apresentação. A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de forma unânime, chegou a esse entendimento ao julgar pedido de habeas corpus a favor de acusado de roubo circunstanciado com emprego de violência e concurso de pessoas.

No recurso ao STJ, a defesa alegou que o juiz de primeiro grau não fundamentou o recebimento da denúncia nem fez menção às questões levantadas na defesa preliminar, apenas designando data para instrução e julgamento. Argumentou ser isso uma ofensa ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, que exige fundamentação nas decisões judiciais. Pediu a anulação dos atos processuais desde o recebimento da denúncia ou novo recebimento da denúncia com a devida fundamentação.

CPP

O relator do habeas corpus, ministro Og Fernandes, observou que, após o oferecimento da denúncia, duas situações podem ocorrer. Uma delas é o magistrado rejeitar a inicial, com base no artigo 397 do Código de Processo Penal (CPP), que determina a absolvição do acusado em algumas circunstâncias – por exemplo, se o fato não for crime ou se houver alguma exclusão de punibilidade. A outra consiste no recebimento da denúncia, com o prosseguimento do feito, podendo o juiz, ainda, absolver sumariamente o réu após receber a resposta à acusação, como previsto no mesmo artigo do CPP.

Segundo o ministro Og Fernandes, não seria possível receber novamente a denúncia. “O artigo 399 do código não prevê um segundo recebimento da denúncia, mas tão somente a constatação, após a leitura das teses defensivas expostas, se existem motivos para a absolvição sumária do réu, ou se o processo deve seguir seu curso normalmente”, esclareceu.

O ministro relator afirmou que o entendimento do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF) é no sentido de que o recebimento da denúncia, por não ter conteúdo decisório, não exige fundamentação elaborada. Nos autos, entendeu o relator, o juiz apresentou satisfatoriamente os motivos pelos quais aceitou a denúncia, não havendo nesse ponto nenhuma razão para anular o processo.

Defesa prévia

O relator, porém, aceitou a alegação de nulidade pela ausência de manifestação do magistrado sobre a defesa prévia. Ele apontou que a Lei 11.719/08 deu nova redação a vários artigos do CPP e alterou de forma profunda essa defesa. “A partir da nova sistemática, o que se observa é a previsão de uma defesa robusta, ainda que realizada em sede preliminar, na qual a defesa do acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que lhe interesse, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas”, destacou.

A nova legislação deu grande relevância à defesa prévia, permitindo até mesmo a absolvição sumária do réu após sua apresentação. Pela lógica, sustentou o ministro Og, não haveria sentido na mudança dos dispositivos legais sem esperar do magistrado a apreciação, mesmo que sucinta e superficial, dos argumentos da defesa.

Ele ponderou não ser obrigatório exaurir todas as questões levantadas, mas isso não autoriza que não haja manifestação alguma do juiz. Na visão do ministro, houve nulidade no processo pela total falta de fundamentação, já que o juiz não apreciou “nem minimamente as teses defensivas”.

Seguindo o voto do relator, a Turma anulou o processo desde a decisão que marcou audiência de instrução e julgamento, determinando que o juiz de primeiro grau se manifeste sobre a defesa prévia. Como o acusado foi preso em 1º de maio de 2011, os ministros entenderam que havia excesso de prazo na formação da culpa e concederam habeas corpus de ofício para dar a ele o direito de aguardar o julgamento em liberdade.

HC 232842

Disponível em: http://www.aasp.org.br/aasp/imprensa/clipping/cli_noticia.asp?idnot=13240